1 Coríntios 14
Houve
uma noite em que o Senhor Jesus reuniu em torno de si um grande número de
pessoas. Na verdade, isso era frequente no seu ministério terreno, então, não
haveria nada demais nisso, a não ser pelo fato de que essa noite foi
especialmente diferente, porque essa é a noite em que Judas Iscariotes o traiu.
Desde a prisão efetuada no Getsêmani, tendo compreendido que Jesus não reagiria,
todos os seus companheiros o abandonaram. Então, completamente só, a reunião em
torno de Cristo assumiu aspectos bem distintos do que Ele havia experimentado
até ali. Jesus tinha muito prestígio e reunia multidões durante o dia, quando
todos podiam vê-lo. Mas aquele grupo não queria que Seus admiradores vissem o
que eles estavam prestes a realizar, e, por isso, orquestraram um plano
perverso para ser executado na madrugada.
Muita
gente se reuniu em torno de Jesus naquela noite, com o propósito de
escarnecê-lo. Primeiro, o Sinédrio. Os líderes religiosos queriam vê-lo, mas
não para adorá-lo; queriam acusá-lo falsamente, esbofeteá-lo, e demonstrar todo
o seu desprezo. Encaminharam-no, então, a Pôncio Pilatos, que o interrogou. Ele
também teve a sua oportunidade de estar com o Rei dos reis. Mas não reconheceu
a Sua majestade. Enviou-o para Herodes, na corte de fanfarrões. Ali, o Senhor
Jesus de novo foi alvo das zombarias. Foi desrespeitado, tratado como um louco
varrido. Herodes pedia por um milagre como se quisesse assistir a um
espetáculo, e tratou o Pai da Eternidade como a um bufão. Diante da recusa de servir
de palhaço, Jesus foi enviado de volta a Pilatos, onde foi submetido à tortura pelos
soldados romanos. Apanhou muito, foi chicoteado, chacoteado e achincalhado. Sortearam
o seu manto. E já que aquele galileu se considerava o Rei dos judeus, tiveram o
cuidado de confeccionar uma coroa de espinhos para encravá-la na cabeça dEle. Pilatos,
então, reuniu no pátio externo do seu palácio uma pequena multidão, para
apresentar o Cristo humilhado, surrado, e “coroado”! Como se não bastasse, os
congregados clamaram pela crucificação. Pilatos não desperdiçou a oportunidade.
Havia muita gente reunida ali para ver Jesus, e se era a cruz que eles queriam,
então a cruz eles teriam. Como tanta gente, Pilatos, bom político que era, usou
a morte de Cristo para seu benefício pessoal.
Diante
de públicos distintos, em lugares diferentes, mas sempre uma assembleia cheia
de gente curiosa e irreverente: zombeteiros e escarnecedores. Agora, na Via Crucis, caminhando ao lado do
condenado, e, em seguida, reunidos em torno da cruz erguida, não para
contemplá-la, mas para divertir-se. O Todo-Poderoso era desafiado e ofendido.
É
notável, portanto, como é possível se realizar uma reunião em torno de Jesus,
congregar pessoas no nome de Jesus, e mesmo assim, não oferecer a Ele a glória
que Lhe é devida. Naquela noite, muita gente se aproximou do Senhor, mas não
com o fim de se aquietarem aos pés do Mestre, e sim para assistir a um espetáculo
de tortura, humilhação, zombaria, e assassinato.
Os
cristãos também se reúnem em torno de Cristo! Não para isso, contudo! Ao
contrário: reúnem-se para adorá-lo. Desde os eventos da crucificação, os
discípulos aprenderam a fazer reuniões. Nos 40 dias em que o Senhor esteve
entre eles, ressurreto, os discípulos ainda gozaram da sua companhia,
inclusive, fisicamente. Reuniam-se por causa de Cristo, e na companhia de
Cristo. Até que, na última reunião, registrada no capítulo 1 de Atos, Cristo, à
vista dos discípulos, subiu ao céu entre as nuvens.
Mas
as reuniões não cessaram. Agora, sem a presença física do Mestre, mas
continuaram a se reunir por causa dEle. Assim como ensinou o Senhor, reuniam-se
no nome de Cristo, em torno de Cristo, desfrutando, agora espiritualmente, da
presença de Cristo. Segundo o Novo Testamento, passaram a se juntar no Domingo,
o primeiro dia da semana, para celebrar a Ceia do Senhor e realizar o que nós
chamamos de “culto”. É claro que quando alguém separa um tempo no seu quarto em
secreto com o Pai, isso também é culto, mas quando falamos em culto público,
referimo-nos aos momentos que se compartilha com outros crentes, sejam nas
dependências da Igreja, nos pequenos grupos da Igreja, ou em cultos domésticos.
O propósito central do culto é Cristo, a exaltação de Cristo, como testificaram
abundantemente os apóstolos. Tudo é dEle, por meio dEle, e para Ele. E não há
razão para os crentes se reunirem se não for para adorar o Filho de Deus, e
dEle se alimentar.
Como,
então, atingir esse propósito da Adoração? O que diz a Bíblia sobre os detalhes
do culto? O que devemos ter em mente, o que é prioridade, como devem ser usados
os dons espirituais concedidos por Cristo ao seu povo? Enfim, o que ensina a Bíblia
sobre o modo como se realiza um culto cristão?
A
passagem bíblica mais significativa sobre isso é o capítulo 14 da primeira
carta de Paulo aos Coríntios. Na verdade, o apóstolo trata do culto público do
capítulo 11 ao 14. Mas é no 14 que encontramos o material mais regulador quanto
ao modo geral em que o culto deve ser conduzido de modo a prestar a Deus a
verdadeira adoração que Ele requer.
Como,
então, o culto público atinge adequadamente o alvo da adoração?
A
Igreja alcança o propósito do culto cristão
1. Ao edificaR
os salvos!
Quando
os crentes se reúnem para o culto cristão, e cada um traz a sua contribuição
por meio do dom com que foi agraciado pelo Espírito Santo, tudo deve ser feito
para a EDIFICAÇÃO do corpo de Cristo. “Assim, também
vós, visto que desejais dons espirituais, procurai progredir, para a
edificação da igreja.” (14.12). “Quando
vos reunis, um tem salmo, outro, doutrina, este traz revelação, aquele, outra
língua, e ainda outro, interpretação. Seja tudo feito para edificação.”
(14.26).
Escrevendo
outra carta, aos romanos, sobre o seu grande desejo de visitá-los e
conhecê-los, Paulo demonstra o seu desejo de que os dons sirvam para a mútua
edificação: “Porque muito desejo ver-vos, a fim de repartir
convosco algum dom espiritual, para que sejais confirmados, isto é, para que em
vossa companhia, reciprocamente nos confortemos por meio da fé mútua, vossa e
minha.” (Rm 1.11-12).
A edificação
dos cristãos deve ser um objetivo muito bem estabelecido na mente de quem
participa do culto público. Para demonstrar isso, o apóstolo Paulo fala sobre o
uso do dom de línguas durante o culto. Ele não proíbe que se fale em outras
línguas, como se vê no final do capítulo. Mas ele deixa bastante claro que, se
não houver interpretação do que é dito em outra língua, isso não contribui de
fato, porque não EDIFICA a ninguém.
O
apóstolo ilustra o seu argumento por meio de três figuras:
- Seria como um instrumento musical que não emite notas afinadas.
- Ou como um cabo corneteiro que erra o comando no meio da batalha e põe tudo a perder para os seus companheiros.
- Ou ainda como dois estrangeiros conversando, sem, porém, com que qualquer dos dois compreenda o que diz o outro.
Em
todos esses casos, o problema é de comunicação.
Paulo alerta sobre a inutilidade em
se dizer coisas que ninguém entende: “estareis como
se falásseis ao ar” (14.9).
Como, então, fazer com que o meu dom espiritual
seja útil aos meus irmãos?
A
maneira mais eficaz é lutar contra a tentação da vaidade. Existem crentes que
usam os seus dons no culto por puro exibicionismo. O caso mais clássico é justamente
o das línguas estranhas, onde é muito difícil não enxergar o interesse em exibir
“poderes espirituais” no objetivo de conquistar prestígio entre a irmandade. Essa
tentação, porém, não está restrita aos falantes das línguas estranhas. Pela
vaidade, macula-se o uso de qualquer dom ou talento. A ordem "Seja tudo feito para edificação” precisa
ser um propósito incutido nos nossos corações, do contrário, Cristo não será
glorificado.
O
pregador pode “falar ao ar” quando, sem caridade, despreza aqueles que não
compreendem o seu linguajar, tais como idosos, crianças ou iletrados. Também,
quando cai no engano de achar que a sua missão é emocionar seus ouvintes. Isso
é possível e aceitável, mas não pode ser esse o alvo de quem ensina.
O
cantor pode “falar ao ar” quando, vaidoso, está mais preocupado em exibir seu
talento musical do que de garantir que toda a Igreja participe do canto. Instrumentistas
podem se equivocar quando não compreendem que a música não é um fim em si
mesmo, mas somente outro meio pelo qual a Igreja é edificada. É por essa razão
que se vê muitos músicos executando solos durante o louvor, solos que não
apontam para a Majestade de Cristo. Nenhum crente é edificado com solos de
guitarra, pois eles não são capazes de comunicar o Evangelho. A oração, a
pregação, a canção, os sacramentos, tudo que pertence ao culto comunica o
Evangelho. Até uma peça teatral cumpriria esse propósito e edificaria os
salvos. Mas solos de guitarra e performances sofisticadas na bateria jamais
serão capazes de revelar a Cristo.
Aquele
que ora, mesmo que no idioma local, pode “falar ao ar” se estiver preocupado em
exibir sua inteligência mediante um vocabulário rebuscado e frases indecifráveis.
E quem se recusa em fazer orações públicas no culto também perde o foco quando
a sua motivação é o medo, porque sequer suporta imaginar que outras pessoas avaliem
a sua performance na oração.
Enfim,
qualquer um: oficiante, regente, intérprete de libras, operadores de áudio ou
datashow, diácono, o presbítero que serve o cálice da Ceia, a professora do
culto infantil... qualquer um pode deixar que a vaidade macule o uso do seu dom
ou de seu talento na hora do culto, e ficar como se falasse ao ar, quando não
compreende que a contribuição de cada crente deve estar voltada para servir aos
demais, e assim a edificação fica prejudicada. Todos os dons devem ser
utilizados para a edificação da Igreja.
A Igreja alcança o propósito do culto cristão
2. ao evangelizar
os não-salvos!
É
verdade que seria um grande erro programar e realizar tudo no culto pensando
nos visitantes. Mas seria outro erro se os ignorássemos completamente. O culto
público também serve para a evangelização. Se nos reunimos para o culto é porque
Cristo nos salvou QUANDO ÉRAMOS PECADORES. A razão do Evangelho são os
pecadores. “Não vim chamar justos, e sim pecadores, ao
arrependimento!”, “Os sãos não
precisam de médico, e sim os doentes!” (Lc 5.32,31). Cristo nos
amou e nos perdoou. O culto cristão gira em torno dessa mensagem, as Boas
Novas. Não há culto se não há pregação do Evangelho.
Paulo
lembra aos crentes de Corinto que PROFETIZAR é muito mais importante do que falar
em idioma desconhecido, porque profetizar é pregar a Palavra de Deus: “O que profetiza
fala aos homens, edificando, exortando e consolando.” (14.3). Esse
é o verdadeiro propósito da profecia. Hoje em dia, muita gente aprendeu a
enxergar profecia como adivinhação. Mas a verdade é que, na Bíblia, no Novo
Testamento, o uso do dom profético está associado ao anúncio das verdades
reveladas por Deus acerca de Si, e não acerca da vida pessoal dos
frequentadores da Igreja. Profecia revela a Deus. Profecia não é um show
vaidoso da capacidade de alguém de adivinhar eventos sucedidos na vida dos
visitantes, e menos ainda a capacidade de adivinhar o seu futuro. Isso é pura
ilusão.
Note
como Paulo considera o dom da profecia: “Agora, porém,
irmãos, se eu for ter convosco falando em outras línguas, em que vos
aproveitarei, se vos não falar por meio de revelação, ou de ciência, ou de
profecia, ou de doutrina?” (14.6). Ora, o que vem a ser isso? revelação, ciência ou conhecimento, profecia, e doutrina? São palavras distintas para se referir a diferentes
aspectos de uma coisa só: a pregação da Palavra de Deus, o ensino. Esse é o
centro do culto cristão, e nenhum outro dom é superior a este. E é
por isso que ele diz: “Portanto,
irmãos, procurai com zelo o dom de profetizar!” (14.39).
A
pregação, o ensino, é o único meio pelo qual Cristo é anunciado aos pecadores. Cada
um pode dizer por si mesmo: uma pessoa só se converte de verdade quando
finalmente entende e se comove pela morte de Cristo na cruz, onde se encontra
remissão dos pecados. Como é que você soube dessas coisas? Foi pela pregação,
pelo ensino da Palavra de Deus. Por isso Paulo enfatiza aos romanos: “E como crerão naquele de quem nada ouviram? E como ouvirão,
se não há quem pregue?” (Rm 10.14).
Portanto,
quando o pregador anuncia o Reino de Cristo, ao mesmo tempo em que o crente é
confortado e animado na sua fé, consolado pela esperança do retorno do Salvador,
enquanto o crente é EDIFICADO, então, aquele que ainda não foi salvo ouve o
Evangelho, entra em contato com as verdades da cruz, conhece as doutrinas da
graça. É na hora da pregação da Bíblia que o incrédulo se torna crente. O uso
dos dons espirituais, portanto, devem também ser dirigidos para este fim. O
pregador tem que escolher as suas palavras no intuito de atingir o coração do
pecador. O músico deve escolher as suas músicas no interesse de fazer o
Evangelho compreensível para o visitante.
Mas
onde é que Paulo ensinou que o uso dos dons deve ser orientado para o visitante
também? Nos versos 23 a 25: “Se, pois, toda
a igreja se reunir no mesmo lugar, e todos se puserem a falar em outras
línguas, no caso de entrarem indoutos ou incrédulos, não dirão, porventura, que
estais loucos? Porém, se todos profetizarem, e entrar algum incrédulo ou
indouto, é ele por todos convencido e por todos julgado; tornam-se-lhe
manifestos os segredos do coração, e assim, prostrando-se com a face em terra,
adorará a Deus, testemunhando que Deus está, de fato, no meio de vós.”
(14.23-25).
O
objetivo, quanto aos visitantes, é que sejam tocados pelo Evangelho, pela
exposição profética da Palavra de Deus, e assim, experimentem o novo nascimento.
Isso só ocorre quando o visitante vê o poder de Deus através da Bíblia, porque
a Bíblia expõe o seu pecado, e expõe a sua culpa, e revela a sua necessidade de
um Salvador. Quando o visitante ouve o Evangelho de Cristo, ele é tocado pelo
Espírito de Deus, e, então, diz Paulo, prostra-se com a face em terra, adorando
a Deus, e testemunhando que Deus está, de fato, no meio dos cristãos. O texto
diz que a profecia serve para confrontar o visitante incrédulo e diante disso ele
se converte. Por que? (A) por ouvir um adivinhador revelando seus segredos
pessoais? ou (B) por ouvir o Evangelho de Cristo, e esse Evangelho expor ao
coração do visitante o seu próprio pecado? O que é mais natural se concluir? As
pessoas se convertem por que, afinal? O testemunho bíblico é que somos chamados
internamente pelo Espírito Santo, quando externamente a Palavra de Deus nos
atinge. Isso não tem nada a ver com adivinhação. Não é adivinhação que leva o
pecador à salvação.
As
fortes emoções provocadas pela ilusão desses pseudoprofetas não são evidência de
nada. Até mesmo um humorista de stand up consegue fazer com que seu público se
identifique com o que diz no show. Adivinhações não passam de um show mal
produzido por um pregador que não tem nada a dizer sobre a Bíblia, e por isso
ele faz fofoca pública no meio do culto. Notem que aqueles que se afirmam como profetas
na Igreja têm muito pouco pra dizer da Bíblia. Eles precisam fazer revelações
porque da Bíblia não entendem. Não nos esqueçamos do que Paulo disse sobre esse
ministério: “O que ensina, esmere-se no fazê-lo!”
(Rm 12.7). A verdade é que quem tem conhecimento bíblico para levar à Igreja, jamais
desperdiçaria o pouco tempo que tem fazendo adivinhações gospel. Assim como,
aquele que tem amor e apreço pela Palavra de Deus, quando vem ao culto, não fica
admirado com falsos profetas. Quem ama a Palavra de Deus não quer ouvir isso,
quer ouvir ensino. Na verdade, ficamos é chateados quando o tempo do culto é dissipado
com essa bobagem toda. Quem ama a Escritura Sagrada vem ao culto sedento e
desejoso de ouvir a exposição da Escritura.
E
o visitante? O não-salvo? O que tem de ser preparado para ele? Show de
adivinhações? Não! O Evangelho da Salvação! O dom da profecia, portanto, é a
capacidade dada pelo Espírito de Cristo para anunciar fielmente a Palavra de
Deus, tanto para a EDIFICAÇÃO dos cristãos como para a EVANGELIZAÇÃO dos pecadores.
A Igreja alcança o propósito do culto cristão
3. ao proclamar
o caráter de cristo!
O
culto público, o conjunto da obra, é uma mensagem em alto e bom som de quem é o
Deus que os cristãos adoram. O culto expressa o caráter do nosso Deus. É dever dos
crentes fazer com que a imagem do Senhor Jesus, que é refletida nesse mundo
pela Igreja, seja uma imagem gloriosa! O caráter de Cristo é anunciado não só
pelo que dizem os seus discípulos, mas também pelo modo como vivem e se
comportam nesse mundo, e, também pelo modo como se reúnem, e conduzem as suas
reuniões.
O
culto público jamais pode ser motivo de vergonha para os crentes. Se ele acontece
numa desordem escandalosa, essa vai ser a imagem que se passará do Deus dos
cristãos. Não pode ser assim! O caráter de Cristo tem de ser refletido pelo seu
povo, como por um espelho. Portanto o povo de Deus, quando se reúne para a
adoração, sempre deve prezar por organização, sobriedade, prudência, e
moderação. “Porque Deus não é de confusão, e sim de
paz.” (14.33). “Tudo, porém, seja feito com decência e ordem.”
(14.40). Decência e ordem são características que proclamam o Deus decente e
ordeiro a quem cultuamos.
Cristo
disse que seríamos zombados e perseguidos pelos incrédulos. Mas a razão da
zombaria é o Evangelho, porque nós anunciamos a salvação através de alguém
condenado e crucificado pelos romanos. O escárnio vem do Evangelho. Portanto, é
vergonhoso e imoral que os crentes sejam amplamente conhecidos por se
comportarem como arruaceiros em seus cultos. Se os crentes se comportam como
loucos, então a chacota tem razão de ser. O próprio Paulo pergunta: “não dirão, porventura, que estais loucos?”
(14.25).
A) O ESPÍRITO DO PROFETA ESTÁ SUJEITO
AO PROFETA!
Nesse
contexto, o apóstolo Paulo argumenta contra aqueles crentes que justificam o
seu comportamento desordeiro no culto colocando a culpa no Espírito Santo. “Ah!
Eu fui tomado pelo poder do Espírito, e depois não vi mais nada!” No entanto,
segundo a Bíblia, “os espíritos dos profetas estão sujeitos
aos próprios profetas.” E por que? “Porque
Deus não é de confusão, e sim de paz.” (14.32-33).
A
afirmação do autor aqui serve contra aquele que quer responsabilizar o Espírito
Santo pela bagunça do culto. Mas o Espírito não domina ninguém. O Espírito
Santo não age como um demônio que assume o controle do corpo humano. Pelo
contrário, a presença do Espírito de Deus tem de gerar o fruto do Espírito: domínio
próprio, autocontrole (Gl 5.23). Quem tem o Espírito não fica dominado, mas é
disciplinado, manso, modesto, equilibrado.
Nos
nossos dias você encontra pessoas que, na hora do culto, alegadamente, entram
em um estado de êxtase espiritual e começam a tremer, rodar, desmaiar, “cair no
Espírito”, correr, pular, dançar, etc. Como se não fosse suficiente, desde
1994, se deu início à chamada Bênção de Toronto, originada numa Igreja no
Canadá. Nesse evento, as pessoas imitam os sons de animais, como latidos,
miados, grunhidos, rugidos, uivos, cacarejos, etc. Caminham como quadrúpedes,
relincham, e são conduzidos por outros crentes por meio de coleiras.
Recentemente, a famosa cantora Ana Paula Valadão fez a sua performance durante a gravação de um DVD em Brasília, imitando um
leão ao engatinhar no palco.
Afinal,
como a Bênção de Toronto se harmoniza com 1 Coríntios 14.33? “Porque Deus não é de confusão, e sim de paz.”
Onde está a decência? Quando Paulo disse que Deus não é de confusão, e sim de
paz, na verdade, era um argumento contra aqueles que alegam ser dominados pelo
Espírito Santo, a tal ponto de perderem a consciência. É visível ou não a
incoerência? Tudo é contrário ao ensino da Bíblia! O espírito que atua nesses
cultos parece não ser o mesmo Espírito que inspirou a redação das cartas de Paulo,
onde se diz, por exemplo, que o espírito do profeta está sujeito ao profeta, ou
que o fruto do Espírito não é o descontrole, mas o oposto.
Então,
por que os crentes fazem isso tudo no culto? Fazem porque não conhecem a
Palavra de Deus, e aprendem esse comportamento leviano por imitação. Cegos sendo
guiados por cegos.
B) LIBERDADE PARA VER A CRISTO!
Na
tentativa, então, de garantir o direito à bagunça e aos improvisos nos cultos
públicos, muitos argumentam citando 2 Coríntios 3.17: “Onde
está o Espírito do Senhor, aí há liberdade!”. E os que citam
esse versículo pretendem afirmar que se o Espírito está no culto, então Ele tem
liberdade para agir. Na verdade, esse é o principal fundamento para se
justificar um culto desorganizado. No entanto, quem utiliza esse verso para esse fim,
provavelmente nunca leu os versos precedentes, 14 a 16.
Nessa
passagem, Paulo não está ensinando sobre o culto, ou sobre o uso dos dons, ou
sobre a liberdade do Espírito para conduzir o culto. Não é isso! Segundo o
contexto, a interpretação correta é: onde está o Espírito do Senhor, ali há
liberdade, portanto, ali houve libertação, libertação da cegueira que impede
uma pessoa de ler a Escritura e enxergar a verdade sobre a salvação em Cristo! É
essa liberdade! Quando se ouve um pastor dizer isso no culto, para estimular as
pessoas à bagunça, certamente devemos nos lembrar disso: “Onde
está o Espírito do Senhor, aí há liberdade”, então, não há mais
cegueira espiritual, já houve libertação! A liberdade não é do Espírito, mas do
pecador. Onde está o Espírito do Senhor, aí há salvação, porque:
- é o Espírito Santo quem convence do pecado, da justiça, e do juízo;
- é o Espírito Santo quem salva;
- o novo nascimento é o nascimento do Espírito.
Quando
lemos a Bíblia, não sofremos da cegueira comum a todas as pessoas, porque temos
o Espírito de Deus, portanto temos liberdade, fomos libertos. “Onde está o
Espírito do Senhor, aí há salvação!”
Infelizmente,
é muito fácil deixar que paixões e desejos carnais encontrem na Bíblia
argumentação aparentemente válida
para justificar o comportamento vergonhoso de que estamos falando. Não é do
culto que Paulo fala, e sim da experiência pessoal de salvação.
C) O CARÁTER ORDEIRO DO REDENTOR!
Por
que, então, manter a ordem no culto? Porque
o culto público proclama o caráter de Cristo: ele não é Deus de confusão, e sim
de paz. O culto tem de ser conduzido por nós de modo a espelhar esse Cristo que
é descente, ordeiro e pacífico. Devemos nos alegrar nos cultos, mas para ser
alegres não precisamos ser indecentes e irreverentes. É perfeitamente possível fazer
tudo com decência e ordem. O tema já foi esclarecido por Paulo. A nós cabe somente
entender e obedecer.
Somente
nesses termos, portanto, é possível EDIFICAR e EVANGELIZAR eficientemente. E só
com decência e ordem é possível PROCLAMAR com justiça o verdadeiro caráter de
Cristo.
Aquelas
Igrejas que abrem mão desses princípios oferecem um desserviço ao Reino de
Deus, porque elas:
- não EDIFICAM seus crentes,
- não EVANGELIZAM seus visitantes,
- e o caráter de Deus que elas conseguem proclamar é de um “deus” diferente dAquele revelado na Bíblia Sagrada.
D) O NOVO NASCIMENTO GERA
PROCLAMADORES DO EVANGELHO!
“Mas as pessoas tem se convertido! Pecadores
estão sendo salvos! Isso, afinal, não deveria servir de evidência de que Deus tem
aprovado o culto desorganizado?”
Pois
bem! Há muita gente na Igreja, “convertida”, que não consegue dar uma palavra
sobre o Evangelho. Isso é um fato! É óbvio que não são todos, e, se são a
maioria ou não, é impossível dizer sem uma pesquisa séria. Mas é visível que
tem muito crente por aí que não é capaz de proclamar espontaneamente o
Evangelho que o salvou. Para piorar, estes mesmos conseguem compartilhar sobre
sua fé, mas falando somente a respeito de vitórias que receberam ou de experiências
extraordinárias que vivenciaram. A boca fala do que está cheio o coração. Eu respeito
aqueles que no exercício de sua espiritualidade obtêm experiências e vitórias,
desde que sua boca esteja cheia do Evangelho, e desde que a importância de sua
Vitória esteja anos-luz à frente dessas pequenas vitórias.
Nem
toda adesão é uma conversão. Os verdadeiros convertidos não glorificam as suas
próprias obras e muito menos os seus méritos. Pelo contrário, glorificam a obra
da cruz e o Senhor que se sacrificou por eles. Tem muita gente aderindo à
Igreja, mas pouca gente nascendo do Espírito, pouca gente passando pelo novo
nascimento. Tem muita gente se emocionando com a palavra de adivinhação de um
falso profeta, mas pouca gente se comovendo com a cruz pregada pelos
verdadeiros ministros do Evangelho. Podem até me criticar por essa posição
(certamente muitos vão), mas uma conversão ao final de um culto em que a cruz
de Cristo não foi proclamada não é uma conversão cristã. É IMPOSSÍVEL que
alguém tenha se convertido sem ouvir acerca da morte e da ressurreição do nosso
Senhor Jesus Cristo, sem que tenha sido confrontado pela Lei de Deus, e chamado
ao arrependimento de pecados. Salvação só é verdadeira se é pela fé em Cristo e
no sacrifício remidor. Do contrário, não passa de uma adesão à Igreja.
Crentes
reunidos desperdiçando todo o tempo do culto com um monte de coisas supérfluas sem dizer nada do Evangelho é a moda das igrejas evangélicas.
CONCLUSÃO
O
Senhor Jesus Cristo um dia se sacrificou! Foi torturado e moído! Um dia Ele foi
humilhado, e as pessoas que se reuniram em torno dele faziam algazarras. No dia
da crucificação, muita gente se reuniu por causa de Cristo, mas não foi para
adorá-lo e nem para ouvi-lo. Reuniu-se para fazer bagunça.
No
culto público, os cristãos fazem diferente. Reúnem-se em torno de Cristo para
ouvir a Sua Palavra. O alvo é ser como Maria, que preferiu a melhor parte. O coração
do crente arde pela Escritura Sagrada, pelo ensino, pela doutrina. Isso é a
verdadeira profecia. No culto cristão celebra-se reverentemente o nome do Senhor,
exalta-se Aquele que foi humilhado, e adora-se com decência e ordem Aquele que
foi vítima de uma gritaria própria de gente desordeira. Quem se reuniu em torno
de Cristo para fazer algazarra foram os inimigos de Deus. Esse fato deveria ser
suficiente para que haja reflexão sobre o modo como tem sido realizado o culto em
cada comunidade local!
Que
se prefira o jeito que Ele exigiu, sem cedermos às paixões pecaminosas que nos
assediam. Que não seja do jeito que nos agrada, mas do modo como Ele requer.
Façamos tudo, portanto, segundo a vontade dEle. “Porque
dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A Ele, pois, a glória
eternamente. Amém!” (Rm 11.36).
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