domingo, 25 de agosto de 2013

O BATISMO DE CRIANÇAS POSSUI ALGUM FUNDAMENTO BÍBLICO?

“Tudo o que eu te ordeno, observarás; nada lhe acrescentarás nem diminuirás.” 
Deuteronômio 12.32


O batismo infantil é um tema controverso para o evangelicalismo brasileiro moderno. Muitos crentes acreditam que esta seja uma característica peculiar do presbiterianismo. Mas, na verdade, a prática de se batizar os infantes está presente em quase todas as tradições cristãs. As exceções mais dignas de serem destacadas são os Batistas e todo movimento evangélico influenciado por eles (no que diz respeito ao ritual do batismo), tais como o Pentecostalismo e o Neopentecostalismo.

Na verdade, recusar o batismo às crianças é um costume relativamente recente na Igreja, já que antes do movimento anabatista não se tem registro de cristãos que assim agissem. Os presbiterianos compreendem que deixar de batizar os filhos dos crentes (ou os menores sob sua guarda) constituiria, sim, em um grave pecado de negligência à ordem bíblica. Para entender, contudo, a razão das Igrejas Presbiterianas preconizarem o batismo de crianças, é necessário conhecer a Teologia da Aliança.

A TEOLOGIA DO PACTO

De acordo com a Teologia do Pacto, Deus estabeleceu a Aliança da Graça com o ser humano decaído, com o objetivo de redimi-lo de sua miséria espiritual. Essa Aliança tem por fundamento legal a Cruz do nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual Deus perdoa e justifica os pecadores que tem fé no Filho de Deus. Contudo, a Aliança foi estabelecida muito antes do evento da crucificação. Para aqueles que são introduzidos na Aliança após a vinda do Messias, exige-se fé na Cruz, um evento histórico testemunhado pelos apóstolos. Quanto àqueles que foram introduzidos antes da vinda do Messias, exigia-se a esperança de que Deus daria cabo definitivamente ao problema do pecado humano, mediante uma solução superior aos rituais provisórios da religião judaica. 

Deus estabeleceu sua Aliança com os homens, oferecendo reconciliação. Sempre foi pela fé, tanto antes como depois da Cruz. Para isso, Ele estabeleceu mediadores desse Pacto, cada um numa época distinta, e sempre num processo de revelação orgânica, progressiva e crescente. Esses mediadores foram:
  • Adão, 
  • Noé, 
  • Abraão, 
  • Moisés, 
  • Davi, 
  • Cristo. 

Os cinco primeiros nomes são mediadores daquela que se chama "antiga dispensação do Pacto". O Senhor Jesus, porém, é o mediador da "nova dispensação do Pacto"; ou, da Nova Aliança.
“Eis aí vêm dias, diz o Senhor, em que firmarei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá.” (Jeremias 31.31).
A Nova Aliança não é nova no sentido de que a Antiga tenha sido anulada. Ao invés disso, são uma só e a mesma Aliança, com seis mediadores, duas dispensações, e a Cruz como centro da fé. Cristo é a consumação do Pacto, e se diz “nova” porque, enfim, em Cristo foi revelada de modo completo e cabal. Segundo Hebreus 1, a pessoa de Jesus é o clímax da revelação de Deus. Em Cristo, o ser humano vê a expressão exata e o resplendor da glória do Pai.
“Eu e o Pai somos um” (João 10.30). 
“Quem me vê a mim, vê o Pai” (João 14.9).

A TEOLOGIA DO PACTO E O BATISMO

Uma vez que a Aliança que Deus estabeleceu em Cristo é a mesma Aliança que Deus fez com Abraão, chega-se à conclusão de que toda a Escritura Sagrada, tanto o Antigo como o Novo Testamento são a revelação inspirada de Deus, pela qual Ele orienta e julga o Seu povo. Esta é a Palavra de Deus.

Diante dessa compreensão, a análise de qualquer tema proposto pela Escritura deve ser considerada sempre em sua revelação integral, pois o Pacto não começou em Cristo, nas narrativas dos Evangelhos, mas em Adão, nas narrativas de Gênesis. 

Considere-se abaixo, portanto, a argumentação de como a Bíblia não só permite o pedobatismo, mas o institui.

1. Abraão foi introduzido no Pacto da Graça e selado com um rito sacramental por causa de sua fé pessoal (Gn 15.6; 17.11).

2. Os termos do Pacto da Graça exigiam que todos os meninos recém-nascidos deveriam ser incluídos nesse Pacto, por meio do mesmo rito sacramental por que passou Abraão (Gn 17.13).

3. Nem o judaísmo cria em regeneração sacramental, e nem os pedobatistas o creem. Todos os hebreus foram circuncidados, mas nem todos eram salvos (Rm 2.25-29; Fp 3.2-3). A circuncisão nunca foi garantia de salvação, mas de introdução na família da Aliança. A circuncisão espiritual e verdadeira era a do coração (Lv 26.41; Dt 10.16; Jr 4.4).

4. A ausência de fé dos meninos judeus jamais implicou em prejuízo para o Pacto, para os meninos, ou para seus pais. A única fé relatada na instituição do sacramento foi a de Abraão, de ninguém mais (Gn 15.6). As crianças foram seladas pela fé, mas não a fé delas, e sim a de Abraão.

5. A recusa em cumprir a aplicação do selo caracterizaria negligência e rebeldia, pecado passível de punição severa (Gn 17.14; Êx 4.24-26).

6. O Pacto feito com Abraão, o pai da fé, não foi ab-rogado. A Bíblia testemunha a continuidade do Pacto, e nas mesmas passagens menciona a participação dos filhos dos crentes nesse Pacto (Is 59.20-21; At 2.37-39).

7. Nos termos da antiga dispensação do Pacto, o selo era o ritual da circuncisão; nos termos da nova dispensação do Pacto, o selo é o ritual do batismo (Cl 2.11-12).

8. O ônus da prova neotestamentária não cabe aos pedobatistas, mas aos credobatistas. Isto é, não são os pedobatistas que precisam encontrar uma passagem no NT que ordene o batismo dos infantes; são os credobatistas que precisam apresentar uma passagem no NT que interrompa esse procedimento. A razão é o seguinte princípio hermenêutico: tudo que está previsto no AT continua em pleno vigor, com exceção daquilo em que o NT apresente a descontinuidade. Se o NT se cala quanto à administração do sacramento aos infantes, significa que permanece o que foi especificado no AT.

9. Se a melhor prova bíblica do credobatismo está em Mc 16.16, é imprescindível afirmar que os mais importantes eruditos em manuscritologia concordam (independente se são credo ou pedobatistas) em que o trecho de 16.9-20 não compunha os autógrafos do texto de Marcos.

10. Supondo, porém, que o texto tivesse validade, considere-se:
> O texto de Mc 16.16 não diz respeito a crianças. Ele é uma regra geral, que não contempla todas as exceções. Se ele diz respeito a crianças, também tem de significar que a criança, por não crer, está condenada. Admitir que os casos de exceção estejam incluídos nesse dito, significaria ainda ter de admitir que é impossível a salvação para alguém que não foi batizado.
> O apóstolo Paulo também escreveu: quem não quer trabalhar, também não coma. Poderíamos aplicar esse texto a uma criança? Evidente que não! Porque essa é uma regra geral válida para adultos. O caso das crianças é uma exceção a essa regra. Desse mesmo modo deveria ser compreendida a sentença de Marcos 16.16. (isso, se o texto fizesse parte dos originais gregos).
> Qualquer insistência em afirmar que Mc 16.16 seja uma ordem para a descontinuidade da aplicação do selo, seria uma forçação de barra fora do comum. A intenção autoral não está nem de perto dirigida à discussão do batismo infantil.
11. O Pacto da Graça tem caráter inclusivo, e não o inverso. Na antiga dispensação, as mulheres *não recebiam* o selo; na nova, o recebem (Gl 3.26-29). Na antiga dispensação, os filhos dos crentes *recebiam* o selo; não há razões neotestamentárias para se imaginar que, na nova dispensação, isso devesse ser interrompido.

Mas, afinal, de que adianta argumentar?
"Aquilo que as pessoas não gostam, elas se esforçam para não acreditar." 
(J.C. Ryle).

3 comentários:

  1. Kevin DeYoung contribuindo muitíssimo com o tema:
    http://reforma21.org/artigos/uma-breve-defesa-do-batismo-infantil.html

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  2. Uma breve defesa do batismo infantil
    ~ Kevin DeYoung

    Isso vai soar como o início de uma piada ou uma apresentação num grupo de apoio, mas é verdade: alguns dos meus melhores amigos são batistas. Eu falo em conferências com e para batistas. Eu leio livros escritos por batistas (vivos e mortos). Eu amo os irmãos batistas que eu sei – próximos e distantes – que pregam a palavra de Deus e ministram fielmente na igreja de Cristo. Eu frequentei uma igreja batista enquanto estava na faculdade e sei que há muitas pessoas de persuasão mais credobatista em minha igreja. Eu imagino que a maioria dos leitores do meu blog são batistas. Você pegou a ideia. Eu tenho milhares de razões para agradecer por meus irmãos e irmãs em Cristo que não creem no batismo infantil.

    Ainda assim, eu creio. Alegremente. De todo o coração. Por causa do que vejo na Escritura.

    Uma das melhores coisas que tenho de fazer como pastor é administrar o sacramento do batismo infantil aos filhos da aliança em minha congregação. Antes de cada batismo, eu separo alguns minutos para explicar por que nós praticamos o batismo de infantes em nossa igreja. Minha explicação sempre inclui alguns – mas raramente há tempo para todos – dos seguintes pontos:

    É nosso grande privilégio nessa manhã administrar esse sacramento do batismo a um de nossos pequenos bebês. Nós não acreditamos que haja algo mágico na água que aplicamos à criança. A água não lava o pecado original ou salva a criança. Nós não assumimos que essa criança é regenerada (embora ela possa ser), nem acreditamos que toda criança que é batizada automaticamente irá para o céu. Nós batizamos infantes não por superstição ou tradição ou porque nós gostamos de bebês bonitinhos. Nós os batizamos porque eles são filhos da aliança e deveriam receber o sinal da aliança.

    Em Gênesis 15, Deus fez uma aliança com Abraão. Essa aliança foi selada com o sinal da circuncisão em Gênesis 17. Deus prometeu abençoar Abraão. Para Abraão, isso significava duas coisas em particular: descendência e terra. Porém, no coração da aliança estava a promessa de Deus de que ele seria um Deus para Abraão e seus filhos (Gn 17.7,8).

    Circuncisão não era apenas algo físico, marcando judeus étnicos. A circuncisão era cheia de significa espiritual. A circuncisão da carne sempre teve o objetivo de corresponder à circuncisão do coração (Rm 2.25-29). Ela apontava para a humildade, novo nascimento e um novo estilo de vida (Lv 26.40-42; Dt 10.16, 30.6; Jr 4.4, 6.10, 9.25). Em resumo, a circucisão era um sinal de justificação. Paulo diz em Romanos 4.11 que Abraão “recebeu o sinal da circuncisão, selo da justiça da fé quando estava na incircuncisão”. A própria interpretação que Deus dá à circuncisão é que ela era muito mais que apenas um sinal físico para o Israel nacional.

    Notavelmente, contudo, esse sinal profundamente espiritual foi dado a Ismael assim como a Isaque, mesmo se somente Isaque fosse a continuação da linhagem prometida. O sinal espiritual não era apenas para aqueles que já aceitavam a realidade espiritual. Ele deveria ser administrado a Abraão e seus filhos. A circuncisão não era uma simples equação. Ela não significa automaticamente que o recipiente do sinal estava de posse da coisa significada. A circuncisão, como o batismo, também apontava para a comunhão, discipulado, obrigações pactuais e abria caminho para a fé futura que tomaria posse das realidades simbolizadas. Assim como havia alguns nos dias de Paulo que eram circuncidados mas não eram realmente circuncidados (Rm 2.25-29), alguns filhos de Abraão que não eram realmente filhos de Abraão (Rm 9.6-8), da mesma forma em nossa época há alguns que são batizados mas não são realmente batizados. As crianças devem receber a marca de que pertencem à aliança, mas, a não ser que elas exerçam a fé salvífica, elas não adquirirão as bênçãos pactuais.

    continua

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  3. continuação

    As crianças de hoje são batizadas com base nessa mesma aliança com Abraão. Paulo deixa claro em Gálatas 3 o que Pedro sugere fortemente em Atos 2, a saber, que a aliança abraâmica não foi anulada. Ela ainda é operacional. De fato, nós vemos a promessa básica da aliança abraâmica percorrendo toda a Bíblia, até o novo céu e nova terra em Apocalipse 21.

    Porque os filhos são partes da aliança de Abraão no Antigo Testamento e foram circuncidados, nós não vemos razão para os filhos serem excluídos no sinal neotestamentário do batismo. Devemos admitir que não há um texto que diz: “Escutai, escutai, o batismo substitui a circuncisão”. Mas, nós sabemos por Colossenses 2.11-12 que batismo e circuncisão carregavam o mesmo significado espiritual. A transição de um para o outro provavelmente foi orgânica. Como os judeus praticavam o batismo de prosélitos, esse sinal veio a ser visto como a marca da inclusão no povo da aliança. Por um tempo, a circuncisão existiu junto com o batismo, mas, enquanto a igreja primitiva tornava-se mais gentílica, muitos dos ritos judeus foram considerados desnecessários e, às vezes, até prejudiciais à fé. Assim, o batismo eclipsou a circuncisão como o sinal de renovação, renascimento e membresia no pacto.

    Embora eles não sejam conclusivos apenas por si mesmos, há diversos outros argumentos que corroboram uma leitura pedobatista do Novo Testamento.

    Primeiro, o ônus da prova está sobre aqueles que negam às crianças um sinal que elas tinham recebido por milhares de anos. Se as crianças subitamente ficaram de fora da aliança e foram proibidas de receber algum sinal “sacramenta”, certamente uma mudança imensa e a controvérsia que isso teria provocado seriam registrados no Novo Testamento. Além disso, seria estranho que as crianças fossem excluídos da aliança quando tudo mais move na direção de mais inclusão do Antigo Testamento para o Novo.

    Segundo, a existência de batismos de casas é evidência de que Deus ainda lida com casas como uma unidade e recebe famílias inteiras na igreja para submeterem-se ao Senhorio de Cristo juntas (Atos 16.13-15, 32-34; 1 Co 1.16; cf. Js 25.15).

    Terceiro, as crianças são ensinadas a obedecerem seus pais no Senhor (Ef 6.1). As crianças na igreja não são tratadas como pequenos pagãos que devem ser evangelizados, mas como membros da aliança que devem fidelidade a Cristo.

    Quarto, em dois séculos desde os apóstolos nós temos evidência clara de que a igreja estava praticando o batismo infantil. Se isso tivesse sido uma mudança de uma tradição antiga, nós teríamos algum registro da igreja discutindo sobre essa nova prática. Não foi até o século XVI que os cristãos começaram a questionar a legitimidade do batismo infantil.

    Assim, nós administramos o sacramento do batismo a essa criança hoje com o peso da história da igreja para encorajar-nos e o exemplo da história da redenção para confirmar nossa prática. Nós batizamos em obediência ao mandamento de Cristo. O sacramento que estamos prestes a administrar é um sinal de inclusão na comunidade da aliança como a circuncisão era, e a água que estamos prestes a aspergir é um sinal da purificação do pecado como o sangue de bois e bodes aspergidos no Antigo Testamento era. Nós oramos para que esse pequeno desfrute de todos esses privilégios pactuais, reconheça seu Senhor todos os dias de sua vida e, pela fé, faça suas essas promessas.

    Traduzido por Josaías Jr
    Originalmente, era publicado no Reforma21.org, mas o link se perdeu.

    Kevin DeYoung contribuindo muitíssimo com o tema:
    http://reforma21.org/artigos/uma-breve-defesa-do-batismo-infantil.html

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